Reparar a injustiça na <i>Sotancro</i>
Dezenas de representantes sindicais e trabalhadores manifestaram-se, dia 1, até à fábrica da Sotancro, na Amadora, contra o despedimento «com argumentos forjados» do dirigente sindical Vítor Correia.
«Despedir sem razão só aumenta a exploração»
«Este despedimento é um grave exemplo de como o patronato inventa, com argumentos forjados, um processo de intenções contra um destacado dirigente sindical, no local de trabalho, com vista ao seu afastamento e à intimidação dos restantes trabalhadores», afirmou Libério Domingues, coordenador da União dos Sindicatos de Lisboa (USL/CGTP-IN), em declarações ao Avante! antes de se iniciar uma marcha de protesto que percorreu as ruas da cidade, desde a estação do Metropolitano, Amadora-Este, até à porta da fábrica, na Venda Nova. Durante a marcha, foram gritadas palavras de ordem como «o trabalho é um direito» e «despedir sem razão só aumenta a exploração».
A «armadilha»
Trabalhador na Sotancro há 14 anos, Vítor Correia é dirigente sindical há seis e também pertence à Comissão de Trabalhadores. Antes desta «armadilha», em 2010, Vítor já tinha sido aliciado para abandonar a empresa. «Quiseram-me comprar por 40 mil euros, mas não aceitei e disse-lhes que não vendo o posto de trabalho nem os meus direitos, depois de ter sido eleito representante dos trabalhadores».
No dia 3 de Novembro, antes de uma reunião com a Comissão de Trabalhadores, o administrador, Jorge Alexandre Ferreira, pediu a Vítor um encontro a sós. «Voltei a recusar vender o meu posto de trabalho e disse-lhe que o meu caso estava a correr nos tribunais, que decidiriam em conformidade». «Foi quando se exaltou, encostou-me à parede, empurrando-me diante de uma directora de Recursos Humanos, e começou a gritar que eu é que o estava a empurrar», conta o trabalhador.
A actuação antidemocrática e autoritária começou a ser quotidiana desde que a Sotancro foi comprada pelo Grupo Barbosa e Almeida, em 2008, afirma a USL.
No dia 18 de Janeiro, dia do vidreiro, Vítor recebeu a comunicação do seu despedimento, sem direito a indemnização, acusado de ter agredido o administrador.
«Em resultado da acção sindical, temos conseguido impedir vários destes despedimentos, mas a actual fase exigirá das estruturas sindicais uma atenção especial a estas situações, devido ao efeito arrasador e intimidatório que estes despedimentos têm nos restantes trabalhadores», explicou Libério Domingues.
Novo perigo no «acordo»
A encenação patronal que levou ao despedimento de Vítor Correia demonstra haver «patrões a tudo fazer para afastar e expulsar os sindicatos e as organizações das empresas», sublinhou Libério Domingues, salientando que «estes comportamentos não são alheios ao recente acordo chamado de “Concertação Social”, firmado entre patrões Governo e UGT». Naquele «acordo que não é lei», deixa de ser obrigatório readmitir o trabalhador, mesmo quando é decretado, em tribunal, que o despedimento foi sem justa causa.
«Face a estas situações, os trabalhadores devem manter-se unidos e organizados nas empresas e desenvolver todas as acções possíveis para enfrentar estas medidas». O membro da Comissão Executiva da CGTP-IN, ao encerrar a acção, avisou que se o trabalhador não for reintegrado haverá novos protestos contra a prepotência do administrador. Concluiu apelando à participação de todos na manifestação nacional de depois de amanhã, no Terreiro do Paço, «também contra o acordo da traição».
Combater a repressão
Vários patrões estão a despedir, sem justa causa, representantes e activistas sindicais. Alguns destes intervieram na acção de solidariedade.
Vítor Otão, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Vidreira, confirmou que a sua organização tem «respondido a processos disciplinares com o mesmo propósito nas empresas Vidal Marques e Leica». «Há também casos camuflados com despedimentos colectivos».
«Este problema não afecta só o Vítor, porque hoje eles despedem-no a ele mas amanhã serão outros», avisou a mãe de Vítor Correia, Maria Henriqueta Butes.
Pedro Jorge, coordenador da Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro lembrou um caso semelhante na ex-Covina, em Vila Franca de Xira, actual Covilis, onde o dirigente sindical Pedro Vicente «está envolvido num processo de despedimento que começou por ser colectivo, de sete trabalhadores». «A seis foi permitida a reintegração e só a ele foi consumado o despedimento».
O dirigente do Sindicato da Construção do Sul, Sérgio Graça, trabalhador da Soares da Costa, «está em casa há mais de sete meses, a receber mas afastado do posto de trabalho».
Na CT-Cobert Telhas, um dirigente do sector da cerâmica e membro da Comissão de Trabalhadores recusou ir para um local de trabalho que não era o seu e foi suspenso por dez dias.
Igor Oliveira, do Sindicato das Indústrias Eléctricas do Sul e Ilhas, salientou que «este problema também passa pela responsabilização do autores dos actos ilícitos». Carlos Carvalho, dirigente sindical na CME, foi reintegrado graças à luta dos trabalhadores e das suas organizações, revelou.
Na Kemet, em Évora, um lay-off foi imposto a delegados e dirigentes sindicais, situação que o sindicato tem acompanhado e que ainda não tem desfecho anunciado.